E a educação vai pro saco mais uma vez, seja por desinteresse pessoal ou por interesse financeiro. E eu me sinto cada vez mais uma idiota, que ainda se preocupa com pontos que parecem ter sido abolidos da vida de todas as outras pessoas.
Comecemos do começo: manda quem pode, obedece quem tem juízo. É assim que a maioria dos alunos chega ao curso de inglês (ou espanhol, ou francês, ou o que seja), mas nem sempre é à risca que eles seguem esta regra. Se fosse só pelo desinteresse dos alunos, o problema seria menor, mas o péssimo mesmo é quando nem sequer os pais ajudam os filhos a entenderem a importância que um idioma estrangeiro tem na vida daquele ser. Já estou cansada de ver aluno que estuda igual a um louco para passar nas provas do cursinho, mal e porcamente consegue acertar 50% da prova e sai glorioso, contente por ter passado ao próximo nível, sem ter noção do que aquilo realmente representa na vida dele. O que representa é uma perda de 50% do conteúdo que ele deveria ter aprendido, que será somada à perda dos semestres anteriores, que serão todas somadas às perdas futuras e assim por diante, causando um grande buraco negro de conhecimentos ocos de um aluno medíocre que, quando tiver sua péssima fluência questionada, vai carregar o nome da escola onde estudou e difamá-la por toda a região. É claro que o aluno é que é o maior culpado de seu próprio desempenho - afinal, se nenhum exercício é feito, se não há esforço para melhorar nem seriedade para entender o aprendizado como chave pro sucesso, não existe metodologia nem professor que façam milagres.
Conheço mães de alunos (inclusive meus) que não se importam com a qualidade do ensino dos filhos, apesar de terem orgulho de pagarem cursos caros. São o tipo de gente que fala pro filho faltar à aula caso esteja garoando ou que acha que língua estrangeira é menos importante do que química ou física (como se um fosse um hobby e o outro fosse obrigação escolar, sendo que os dois podem ser a diferença entre o filho ser rico ou pobre). Além disso, há também os colégios e os cursos de idiomas que preferem não falar para os pais quando o filho está indo mal nas matérias, com medo de que os responsáveis tirem os filhos daquela instituição. Não consigo entender o pensamento de quem só pensa no lucro, mas se eu tivesse uma escola onde alguns alunos não aprendem nada, onde não conseguem desenvolver seus conhecimentos, eu falaria constantemente com os pais ou responsáveis, a fim de que se preocupassem mais com a educação das crianças. Se isso não fosse suficiente, não permitiria que eles continuassem na escola. Afinal de contas, caso eles não aprendam nada, vão sair pelo mundo falando que "naquela escola não aprenderam nada", o que é muito pior do que ficar conhecida como "a escola que não quis tal aluno."
Mas é tanta situação bizarra que eu, sinceramente, não sei mensurar se o pior mesmo é quando não há estímulo ao estudo ou se é quando o estímulo existe, mas o profissional é talhado por motivos financeiros.
Digo por algo que aconteceu a uma amiga: ela trabalha em uma rede de cursos de idiomas famosa e um aluno novo entrou em uma turma que está ministrando. Ele perdeu cerca de 3 ou 4 lições, a turma já estava se preparando para fazer a primeira prova e ele, obviamente, precisava de aulas de reforço, pois estava tendo certa dificuldade em seguir o mesmo ritmo da turma. Em uma aula de reposição, foi visto apenas um dos conteúdos dentre os que foram perdidos. Foram marcadas outras aulas de reposição, que a pessoa responsável pelo curso fez questão de vetar devido aos valores que deveriam ser pagos à professora para que ministrasse as aulas extras. Segundo a pessoa, os valores seriam altos demais e não haveria necessidade do aluno ter tantas aulas extras se o conteúdo da primeira prova era bem tranqüilo de ser entendido e de cunho bem básico. Minha colega ficou boquiaberta, primeiramente, pela cara de pau: como um curso grande no Brasil, reconhecido em diversas capitais, pode dizer que um valor entre R$12 e R$16 a hora/aula pode ser "alto demais"? Isto significa que se a hora/aula for de 1h15, em duas aulas o professor ganharia apenas R$24 (ou R$32, considerando o valor de R$16, praticado em pouquíssimos lugares). Diversas profissões de ensino médio ganham mais do que isso. Ela aceitou, então, mediante tamanho absurdo, ministrar as aulas gratuitamente, pois quem acompanha o aluno freqüentemente é ela, quem sabe onde o aluno está bom ou precisa melhorar é ela, e como boa profissional e preocupada com o aprendizado do aluno, ela sabe que seu dever é fazer o necessário para que ele aprenda - o que ela não esperava era que a pessoa que a contrataria não estaria interessada em que ela desse o melhor de si na sua profissão (segunda atitude que a deixou boquiaberta), condição sine qua non para a manutenção de qualquer emprego.
Outra coisa que me deixou extremamente irritada, e esta aconteceu comigo, cabe ao respeito que é dado ao profissional. Quando alguém se apresenta como tradutor, intérprete ou revisor sempre rola um status por trás da definição, algo quase místico, que as pessoas não sabem bem como funciona, mas sabem que é daquele serviço que precisam para realizar determinada ação. De certa forma, isto é um bom resguardo para nós do ramo. O respeito que ganhamos em nosso meio é nossa base para todos os trabalhos que realizamos e condição propícia para nossa própria alimentação e sustento! E isso deveria ser a base para todo trabalho, em qualquer área. Mas vejo que o professor já é uma classe tão rebaixada que está perdendo, aos poucos, o respeito pela sua atividade, muitas vezes dentro do próprio ambiente de trabalho. O que aconteceu foi o seguinte: como forma de manutenção minha em MG, além de realizar traduções e revisões, também dou aulas (eu e a maior parte dos tradutores da torcida do Flamengo). Estava de bobeira, então, esperando uma aula começar num dos cursos onde trabalho quando apareceu uma simpática menina na recepção procurando um serviço especial: algo como um intérprete, mas não seria necessário falar com ninguém. Na verdade, era apenas para ajudá-la a fazer uma prova virtual de inglês para um processo seletivo, para o qual ela gostaria muito de passar e não gostaria de ter erros. Perguntou para o coordenador do curso se algum professor toparia fazer isso e ele me chamou para conversar com a simpática menina. Disse-me que eu poderia discutir horários e valores diretamente com ela, uma vez que não teriam nada a ver com meu trabalho naquele curso, e saiu para sua sala. Dei meu valor (R$50 a hora) por três motivos: primeiro, eu estaria, de certa forma, sendo submetida a um teste de uma empresa, cujo vocabulário eu não dominava e cujas questões eu teria a obrigação cívica de acertar, pois o emprego da menina dependia (também) daquela prova. Segundo, porque eu não fazia idéia de quanto tempo ficaria presa àquele teste. Terceiro, porque além de tudo descrito acima, a menina não tinha fone de ouvido e eu teria de levar o meu. Após ter explicado tudo isso, o coordenador retorna à recepção e - novamente - reitera qual é a motivação da menina em estar ali (ele já havia comentado antes) e comenta que, provavelmente, seria algo bem fácil de fazer, que eu poderia até mesmo combinar com ela um valor aproximado de R$30, que é o valor cobrado pela hora/aula naquele estabelecimento.
Ora. Pera lá! Primeiro, aquele trabalho não tinha absolutamente nada a ver com dar aulas, inclusive era mais complexo e a sobrevivência de alguém dependia dele, então não haveria motivo algum para que o custo dele fosse o mesmo de uma aula de inglês. Segundo, eu não ganho R$30 por hora/aula, nem conheço alguém no referido estabelecimento que ganhe. Sem falar que foi uma falta de respeito danada se meter na minha negociação com a cliente, sendo que o curso não levaria nada em cima disso. E se quisesse levar, que tivesse me avisado antes.
O que quero dizer com tudo isso? A educação é uma instituição falida no Brasil em ambos os lados: dos alunos, que não querem aprender, e dos profissionais que não querem trabalhar de forma a beneficiar os alunos. No meio de tudo isso existem os professores, que tentam, de diversas formas, fazer o melhor trabalho que podem, como um contra-peso entre a má vontade dos alunos e a política capitalista do empregador, com foco na mais-valia o tempo todo e de todas as formas possíveis. A única parte que dói o coração de ver é que o professor, por mais que lute contra isso, sabe a importância que o aprendizado tem na vida de alguém e, se for um bom profissional, atento com a ideologia que carrega a profissão, não vai se lembrar de que precisa comer quando um aluno tem uma dúvida, quando precisa de uma aula de reforço que não será paga porque isso vai tirar a mais-valia do empregador ou quando estiver criando diversas atividades para chamar a atenção dos alunos que já não querem mais estudar. É muito triste ver que entre a falta de noção de mundo de um adolescente e a falta de respeito pelo profissional da educação, existe uma pessoa que vai perder noites em claro pensando em como mudar o mundo, que vai dormir de madrugada para preparar uma excelente aula para que aquele curso não perca o aluno que tem ou para pesquisar assuntos que sejam interessantes para aquela turma de alunos já sem futuro, mas que o professor busca uma brecha de luz para iluminar a mente.
A educação é uma instituição falida porque é composta, basicamente, por três setores, e apenas um deles trabalha para que seja mantida. A maioria do resto pensa apenas em si. E enquanto a educação não for tratada com seriedade neste país, enquanto as pessoas não entenderem que qualquer aprendizado faz a diferença entre uma vida boa e uma boa vida, enquanto o empenho for nos números e não nos fatos, não vejo como a educação pode progredir.
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