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5 de mar. de 2009

Pai, afasta de mim este cálice.

Abri a Folha de São Paulo esta manhã e me deparei com uma notícia que me deixou aflita. Minha mãe disse que era "notícia velha", mas não deve ter mais de três dias.

A notícia: "O Ibama recuou na exigência de um depósito final para o lixo das usinas nucleares ao autorizar ontem a retomada da construção da usina de Angra 3 - interrompida nos anos 80. Em vez do início da construção de um depósito final até 2014, um de 'longo prazo' para os rejeitos deverá ter um projeto detalhado até a conclusão das obras da usina."

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), ao qual é subordinado, e desenvolve atividades para preservação e conservação do patrimônio natural, além de realizar estudos ambientais e liberar licenças para empreendimentos a nível nacional. Nasceu em 1989.

Há umas duas décadas, aproximadamente, começou-se a pensar seriamente sobre problemas ambientais e seus possíveis impactos e como amenizá-los. Como a usina térmica convencional utiliza muita queima de carvão, gás e óleo para gerar energia, o que aumenta a quantidade de dióxido de carbono no planeta, criou-se a usina termonuclear, um tipo de "energia limpa". Nela, usa-se material nuclear para gerar energia.

(Mas como isto é possível?
Chama-se reação nuclear quando um nêutron colide com o átomo de elemento, elevando seu núcleo a um nível de energia acima do normal. Quando o átomo se fragmenta, ocorre um processo chamado fissão nuclear. Com sua fragmentação, ele libera grande quantidade de energia térmica e dois ou três novos nêutrons, que sofrerão mais reações nucleares e outras fissões. Elas aquecem uma certa quantidade de água, armazenada em um reator, que se transformará em gás e movimentará a turbina acoplada ao gerador elétrico, o que produzirá eletricidade. Usa-se, geralmente, o Urânio, por ser extremamente radioativo e poder ser melhor aproveitado para este tipo de geração de energia.)

Acontece que a produção de energia em usinas termonucleares produz lixos extremamente tóxicos. Para ter uma noção do nível de toxina de uma reação nuclear, podemos tomar como exemplo o ataque Estadunidense a Hiroshima e Nagasaki, em 1945, usando uma bomba nuclear. O elemento radioativo tem um período de vida chamado meia vida, pois com o passar de um tempo X sua quantidade reduz pela metade. Por exemplo, se um átomo de Urânio tem 120g hoje e meia vida de dois dias, daqui a dois dias ele terá 60g, e assim por diante. Por causa disso, os efeitos de uma radiação/reação nuclear jamais se esgotam; permanecem por tempo indeterminado, ainda que em quantidades ínfimas, mas jamais nulas. Até hoje nas duas cidades citadas acima nascem pessoas com deficiência físicas causadas pelo ataque americano - e já se foram 64 anos...

Para que acidentes como estes não ocorram às demais gerações, descobriu-se que a melhor e mais segura maneira de guardar os resíduos liberados em uma usina termonuclear é enterrá-los em depósitos impermeáveis (feito de cimento ou qualquer material muito resistente) durante tempo indeterminado.

No Brasil, temos duas usinas nucleares, ambas localizadas em Angra dos Reis, litoral sul do Estado do Rio de Janeiro. Ambas têm potência aproximada de 1350 megawatts/hora - o que é MUITA coisa! Só de pensar que elas abastecem BOA parte do Brasil com a energia que produzem, dá pra analisar quanto de lixo é recolhido delas por dia. Todo esse lixo precisa de um destino, que é o chão. O grande problema do lixo ser enterrado é que sempre há uma margem de erro de o galão ter uma rachadura e o material nuclear passar para o solo, o que acabaria rapidamente com os produtos agrícolas e entoxicaria as plantas, que seriam ingeridas por animais e seres humanos e passariam átomos de elementos radioativos a consumidores primários/secundários/terciários. O resultado? Doenças de pele, doenças mortais, mutações genéticas nas futuras gerações, etc...

Enquanto estava no governo no cargo de ministra (e, devo dizer, uma das MELHORES ministras que o Brasil já teve), Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima, mais conhecida como Marina Silva, lutou bravamente para que a usina de Angra 3 não fosse construída, levando em conta a falta de espaço para o lixo que seria produzido e o dinheiro gasto para sua construção, que seria enorme. A idéia era de que o lugar reservado para Angra 3 se tornasse um "lixão radioativo", preservadas suas medidas de prevenção de acidentes.

Foi eleita em 2003 no primeiro ano do governo Lula e começou a enfrentar problemas com outros ministros quando os interesses econômicos se contrapunham aos objetivos de preservação ambiental. Em 2006, quando da reeleição de Lula, afirmou que alguns de seus projetos haviam sido paralisados, como a criação de uma área de preservação da Floresta Amazônica. Ao tentar impedir obras no Rio Madeira, em Rondônia, a então ministra da casa civil Dilma Houseff afirmou que Marina estava bloqueando o crescimento econômico. Denunciou dois governadores (um do MS e outro de RO) por desmatamento e, em 13 de maio de 2008, pediu afastamento de cargo ao presidente Lula em razão da falta de sustentação à política ambiental. Durante sua carreira, recebeu dois prêmios por sua atuação na preservação do meio ambiente: o Prêmio Goldmann, nos EUA, e o Champions of the Earth, maior prêmio na área ambiental das Nações Unidas.

Há quem diga que Marina Silva tenha sido forçada a desligar-se do MMA por suas idéias de preservação ambiental. Temos de concordar que lucro e preservação são duas palavras que não têm nada a ver. É uma pena que 45 anos após a ditadura militar ainda tenhamos atitudes covardes como esta, onde o interesse está acima de tudo e onde a verdade não é a melhor das idéias. É uma vergonha para o Brasil vender parte da Amazônia, ainda mais para estrangeiros. Isto é falta de porrada na cara e patriotismo. É um risco enorme a construção de Angra 3 além de ser um custo elevadíssimo desnecessário.

Enquanto uma parcela da população só pensa em dinheiro, extravios e afins, a outra parte - majoritária, devo relembrar - só pensa em como melhorar sua qualidade de vida e tentar levar uma vida digna. O meio ambiente não é um talão de cheques, não é um jogo que pode ser refeito a qualquer hora. É apenas um e se acabar, acabamos.


"De que me vale ser filho da santa?
Melhor seria ser filho da outra.
Outra realidade menos morta... tanta mentira, tanta força bruta.
Pai, afasta de mim este cálice (...)"
Chico Buarque de Hollanda.