11 de abr. de 2012

"A final song, a last request, a perfect chapter laid to rest."

"- Sinto-me mal.
- Por quê? - ela não conseguia conter a preocupação em seus olhos. Seu carinho era imenso, mas imerso sob um manto gélido de difícil penetração.
- Nada que importe. Apenas uma arritmia. Há de ser apenas o movimento do coletivo.

O banco de trás do coletivo, que outrora fora um confortável assento da carruagem nupcial; o motorista, que em outros tempos haveria sido condutor de tão belos devaneios e roubos amorosos; as fugas para os teatros da capital; os cachorros do interior; hoje tudo não passa de um coletivo, que passa levando e trazendo testemunhas de um crime sem réu.

Desceram do bonde como perdidos. Sabiam o caminho para casa, mas não se era para lá que queriam ir. Até que, àquela hora, passado o horário de moça direita estar em casa, decidiram sentar em um banco de uma praça, à vista de todos (da lua!! Das estrelas!!... das pessoas...), cousa absurda nove meses antes.

- Quero que me digais o que vos ocorre.
- Por que tão grã-palavras?
- Olhai ao céu. Que vedes?
- Tudo. - suspirou e refletiu. - A lua minguando a um quarto e estrelas brilhantes que banham um céu índigo.
- E o vento?
- Que tem o vento?
- E o vento? Para onde sopra?
- Que me dirias tu?
- Que, a julgar pela linda e movimentada sombra que vos recai sobre os ombros, venta rumo às montanhas.
- Então por que perguntaste?
- Por suposto que espero respostas.
- E se não forem as que felicitar-te-ão?
- Saberei, pois, que o vento venta em direção ao cemitério, e que minh'alma, por desventura, há de estar lá, junto a tantas outras em frios aposentos.
- E se minhas palavras felicitarem-te, teu caminho seria inverso?
- Não, mas menos tortuoso seria ao ter em meus braços tão formosa donzela (que sois) a esbanjar inveja por suma nobreza carregar ao longo de todo o Santana!
- Então, queres uma resposta por um capricho?
- De certo que sim! Pois como haveria de ser pouco caprichoso e egoísta o homem que tem a fortuna de poder cuidar da mais bela rosa que esta cidade já viu?
- Deduzo, pois, que há rosa mais bela no mundo.
- Sim, obviamente: a rosa que dela brotar.

Beijaram-se em público, negando a existência de qualquer um que ali estivesse. Não se encontraram desde a última viagem e não contiveram a saudade grudada em um abraço nem o desejo ao pé do ouvido, amenizado em um aperto de mãos.

Saíram do transe: após haver dito a ela que esperava respostas, ambos perceberam que sonharam acordados. Maldita sintonia! Havia dado o ar de sua graça uma vez mais, de forma tão inesperada quanto perfeita. Uma cachoeira de pensamentos em poucas frações de segundo.

Os olhos dele não encontravam os dela, embora esse fosse um pedido corriqueiro. O cabelo dela não saía de seus olhos, para evitar que desmentissem qualquer informação veiculada pelos lábios - que não queriam, de fato, falar.

Abraçaram-se envergonhados, sem saber direito o que fazer, viraram de costas e saíram como estranhos, desconhecidos que não mais sabiam onde estavam ou o que queriam. Ou talvez não quisessem nada. Dormiram com o pesar das pálpebras, salgadas como os mares do norte, e gélidos, como os ventos do sul.

Àquela noite o céu tornou-se nublado e o frio foi o pior em décadas. Mariana acordou gris, chorando um ano de lembranças tão dolorosas quanto carne viva. E aquela cidade, tão pequena, tornou-se enorme de repente e houve uma distância quilométrica entre o que antes tardava apenas quinze minutos para fazer o dia ter valido a pena."


Anna Carolina Land Corrêa.
Ouro Preto, 11 de abril de 2012.

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