28 de nov. de 2014

"A menos que o coração sustente a juventude, que nunca morrerá"

E se jogar água, será que você volta?




Eu ainda não consegui engolir a notícia. Tem uma bola de dor engasgada na minha garganta e não lembro de ter chorado esse tanto desde 2011, quando meu avô morreu. Acho que era essa a tríade da minha vida: você, meu avô e meu pai. E nada mais na minha vida vai ser tão marcante quanto vocês três.

Eu cresci com você: quando eu nasci, o SBT já passava os episódios (dublados) e eu adorava ver. Desde criança, eu não perdia nenhum episódio. Sabia todos de cor. Você era um gênio, Bolaños: eu nunca me cansei de rir da mesma piada. Eu só não entendia o "b de burro ou b de vaca", porque no Brasil são coisas diferentes, mas a minha motivação para aprender espanhol era entender essa piada. Quando entendi, minha motivação era aprender as outras.

Por que você se foi, Bolaños? ...

Eu sei que você não me conhece. Sou mais uma nas milhões de pessoas que te seguem no Twitter, e isso é tão pouco frente a todas as outras que você nunca chegou a conhecer. Meu pai, inclusive, culpado pelas minhas lágrimas hoje. Se eu sinto como se tivesse perdido um membro da família, isso é culpa dele que me fez gostar do seu jeito humilde e cotidiano na vila. Eu sei que você não me conhece, mas eu sei tanto sobre a vida que você nos mostrou...

A cada episódio, papai e eu conversávamos. Recontávamos as piadas, brincávamos um com o outro. E mesmo quando brigávamos, bastavam alguns minutos do programa pra tudo se dissipar. Depois, mais tarde, mamãe chegava do trabalho, eu conversava com ela sobre o que se passou no episódio e ela explicava tanta coisa!! Professora de história, me contava sobre todo o período histórico e a situação financeira do México nas décadas de 1970 e 1980, período em que o Chavo del Ocho passava pela Televisa. Entendi os cortiços, entendi a pobreza, entendi o sistema de educação... entendi tanta coisa. Entendi que você era mais que um comediante: era um debochado, fazendo as pessoas rirem da própria desgraça. Eu adorava isso. Meu avô e meu pai também eram assim.

Por que você se foi, Bolaños?! Por quê?!

Foi com o Chaves e com o Chapolin que eu aprendi que a vingança nunca é plena, mata a alma e envenena; que o símbolo da morte é a caveira; que uma boa aula é dinâmica; que apesar dos desentendimentos, a amizade vem sempre em primeiro lugar. Aprendi que o problema da fome pode estar mais próximo do que se imagina e que as bruxas têm lá seu charme (e um gatinho lindo!). Aprendi, também, que é preciso saber a verdade antes de sair fazendo justiça com as próprias mãos em qualquer gentalha e que há de ter atenção nas coisas que se faz. 

Também aprendi coisas mais profundas: que gente rica e pobre habita um mesmo lugar, então estão todos no mesmo barco. Aprendi, com Seu Madruga, que já foi sapateiro, vendedor ambulante, atendente, cabeleireiro, e tantas outras coisas, que o importante não é o cargo que você ocupa, mas sim o trabalho que você faz. Aprendi, com Seu Barriga, que ajudar ao próximo (seja comprando um sanduíche, seja levando pra Acapulco) é essencial. Chiquinha, destrambelhada que só, apesar de fofoqueira e um pouco mentirosa, me ensinou o valor de uma amizade sincera, me fez ver o que é ser amiga para todas as horas. Quico, com toda sua arrogância, ainda levava a inocência na alma e tinha um coração maior do que as bochechas. Aprendi a fazer o café com Dona Florinda e hoje não consigo mais dormir de tanto que tomo e, a cada aula que preparo, sempre imagino como o professor Girafales faria para que seus alunos entendessem aquela matéria, mesmo com todas as dificuldades financeiras e sociais de um Estado em crise (a situação por aqui não mudou muito).

Ah, Bolaños... uma vez você respondeu um Tweet meu e eu fiquei tão feliz! Sei que você fazia isso com todos, mas pra mim foi especial.  Minha maior motivação para aprender espanhol era apenas uma: ir a Acapulco (que aqui ficou sendo o Guarujá), queria conhecer o lugar com o por-do-sol mais conhecido da televisão sul-americana. Ainda está nos planos.

Há alguns anos eu comecei a me questionar o que eu faria se você morresse. Eu não sou ninguém na sua vida, mas você não sabe o tamanho do carinho e admiração que eu trago por si. Todos os ensinamentos de uma vida estão internalizados no meu coração e na minha mente. Se eu tenho um posicionamento mais humano quanto a certos assuntos, se eu hoje estudo em Linguagens uma área que busca entender o contexto geral de produção de um discurso para compreender melhor o que está, de fato, escrito em suas entrelinhas, se eu hoje sou tão literal, é por mérito seu. E há anos eu venho me perguntando como seria o dia que eu recebesse essa triste notícia.

E hoje eu digo: foi horrível. Foi horrível porque é você que está saindo. Foi horrível porque eu não fui a Acapulco ainda, eu não consegui realizar um grande sonho que era dar uma esticadinha até Cancún e tentar te dar um abraço forte e agradecer por toda uma vida de aprendizado e muitas risadas. Foi horrível porque eu senti uma parte de mim morrendo junto. Em tudo que eu faço há um pouco do Chaves. Vê-lo na mídia com uma notícia tão arrasadora foi um abismo pra mim.

Entre soluços e muitas lágrimas eu encerro esse post sabendo que você nunca vai lê-lo, não mais, e sabendo o quão ridícula eu sou por chorar por alguém que sequer sabe que eu existo. De toda forma, eu agradeço por tudo o que você me permitiu ser e por tudo o que você fez por gerações e gerações. Seu legado continuará, seja nas telinhas, seja na associação que você criou. Você é uma lenda agora e não merece menos do que todo o amor e a gratidão de uma nação de fãs.




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