7 de out. de 2011

"Tira essa lama das botas"

"Eu, Fulano(a), 20 anos, acabado(a) e depressivo(a)."


Parafraseando um livro muito famoso que retrata a biografia de uma prostituta aos 13 anos, tenho presenciado muito a frase acima. Uma lástima.

Não sei o que está acontecendo com a sociedade, mas a depressão tem sido uma doença tão corriqueira quanto gripe, mas seus sinais nem sempre são perceptíveis a olho nu. Só ao meu redor eu já vi 1 caso de depressão que foi superado (sem ajuda de remédios) e outros 3 em andamento, sendo que um deles está bem avançado e os outros dois estão no início. A pessoa que saiu da depressão tem 32 anos, uma vida estável, poucas apurrinhações (assim como todo mundo) e um emocional declaradamente abalado, repleto de espaços que se esvaziaram com o tempo durante uma relação cheia só por um. As outras 3 pessoas têm menos de 25 anos e nenhum motivo realmente importante para terem desenvolvido depressão: todas passaram para boas faculdades, estão em perfeito domínio de suas capacidades mentais, a ponto de compreenderem seu estado atual, possuem famílias equilibradas, base emocional bem tranquila por conta do apoio familiar... então, por quê? Por que são diagnosticadas com depressão? E o que está acontecendo com elas?

O que vejo de igual nos 3 perfis que tenho ao meu redor é o computador. Todos eles passam o dia no computador, não têm vontade de fazer nada (ou têm e não têm animo de fazer), só comem e bebem porque é necessário. Tudo que lhes era prazeroso agora lhes parece um fardo e a vida vai tomando formas que antes não precisaria. É normal que todos troquem o dia pela noite, virem vampiros cibernéticos à procura do quanto de prazer aquela máquina pode lhes proporcionar - é um prazer momentâneo, não vai durar pra sempre nem curar a depressão, mas eles só precisam disso mesmo, de uma atenção momentânea a todo momento, um pouco de carinho a cada vez que precisam lembrar-se de quem são, e o computador sempre tem algo de interessante pra ser curtido no Facebook, um vídeo engraçado no Youtube, uma pesquisa maneira no Google e sempre alguém pra se ter uma conversa doida em algum jogo on-line ou no MSN.

Seria, então, culpa do avanço tecnológico? A vida cibernética pode estar distorcendo o real e o virtual e fazendo as pessoas acharem que a depressão é apenas virtual e que o mundo real vem de dentro pra fora da máquina?

Não acredito. Prefiro a tese de que a depressão está se tornando cada vez mais comum nos grandes centros à medida que os jovens estão sendo cobrados cada vez mais como adultos. Aos 18 precisamos ter nossa vida claramente decidida, aos 20 precisamos minimamente de um estágio. Aos 25 temos que estar trabalhando. Depois, podemos fazer o que quisermos, mas sabemos que não é bem assim. Mercado de trabalho é algo cruel, nos obriga sempre a diversas coisas, muitas vezes precisamos largar os estudos em troca de um pão com manteiga à noite por não ter um miojo para comer em casa. E é claro que isso influencia quem recém saiu de uma fase conturbada que é a adolescência, quem recém descobriu qual caminho seguir, qual não seguir, quem ser, quem não ser, o que pode dar certo, quanto tempo ainda resta pra ser perdido... é uma cobrança infundada para quem sequer descobriu por quê o céu é azul.

Os grandes centros estão cada vez mais abarrotados de gente, é impraticável conhecer todas as pessoas a fundo, então é necessário um modelo de vida. É preciso que todos vivam de forma parecida pra que as necessidades da vida urbana se adaptem às pessoas. Mas, na verdade, deveria ser o oposto: as pessoas é que deveriam adaptar-se ou não. Se é a vida urbana que precisa se adaptar à pessoa, o que acontece se isso não acontecer? A vida urbana exclui essa pessoa e ela precisa recorrer a alguma outra forma de vida para suprir aquela necessidade de entrosamento social e sentir-se alguém no meio de tantos, sentir-se notado e notável entre tantas dezenas de rostinhos perdidos na multidão da 25 de Março (SP), Praça da Liberdade (MG), Praça XV (RJ), Parque Farroupilha (RS), Pelourinho (BA), 5ª Avenida (EUA), Campos Elísios (FRA) e tantos outros grandes centros desenvolvedores de cibernéticos viciados no mundo "real." Aliás, qual dos dois muntos era virtual, mesmo?


Fico muitíssimo triste de ver tantas pessoas queridas recorrendo a tarjas pretas para tentar suprir uma necessidade que a cidade requer. Fico mais triste ainda de saber que existe quem perceba que tem depressão e não lute contra isso. Tenha força, você SÓ tem 25 anos ou menos, é um quarto de sua existência e tudo o que você fez até agora foi comer, dormir e jogar no seu Windows Home Edition com um HD estratosférico, uma memória RAM invejável, só jogão foda rodando em rede e um char que é conhecido por todos que estão on-line naquele momento com você, nesta madrugada fria, em que você queria mesmo era estar dormindo pra, no dia seguinte, acordar bem disposto pra fazer tudo o que você sempre quis fazer mas não faz por estar jogando nesse seu computador super foda, com gente super legal, que não quer fazer mais nada além de jogar. E ouvir música. E twittar. E ler blogs, especialmente de quem vos desabafa agora.


Sou da Letras, com orgulho total em assumir isso (antes que me perguntem), não possuo conhecimentos técnicos pra comentar o que vou comentar agora, mas gostaria de fazer um apelo à galera das Ciências da Computação ou para quem possa trabalhar nesta área: se o computador serve tão bem ao trabalho e entretenimento, por que não criar um software, um jogo, alguma coisa que rode em qualquer computador, e que possa ajudar a pessoa quanto à depressão? Talvez um jogo que surta o efeito inverso do que os demais jogos: em vez do jogo prender sua atenção na máquina, por que não um jogo filosófico? Que faça o jogador pensar, refletir, questionar-se, encontrar-se, entender-se?


Seria a máquina tendo, novamente, sua característica inicial: ajudar o homem.
Seria o homem tendo, novamente, sua característica inicial: domínio do mundo e de tudo o que lhe cerca.

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Um comentário:

  1. Oi Carol.
    Acho que o problema não é a falta de softwares, nem o excesso. As pessoas não aprenderam a ser tristes, todo mundo hoje acha que nasceu para ser herói, não sabe perder, pois tem tudo nas mãos.
    Na época dos nossos pais não era tão diferente, meus pais trabalharam desde cedo, não é a pressão de hoje que é diferente, é a forma como as pessoas encaram.
    Os pais são super protetores, dão tudo na mão, e isso é ruim, pois não aprendemos a buscar por nós mesmos.

    Dá uma olhada nesse artigo, a autora comenta isso de forma brilhante:
    http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI247981-15230,00.html

    Abraços,
    Alessander

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