17 de out. de 2015

"Cálice"

Quando falo que sou carioca muita gente não entende por que resolvi deixar uma cidade grande e me mudar pro interior. Além da especialização profissional, eu buscava um pouco de paz e sossego, um pouco de frio, um pouco de humanidade.

Das coisas que mais me incomodavam no Rio, a falta de respeito era a pior. Ela vinha de todos os lados: gente que pulava a catraca do ônibus sem motivo, assaltos à porta de casa (eu mesma tive dois celulares roubados numa mesma semana quando voltava do trabalho), prefeitos que roubam vigas de viadutos derrubados. Certa vez, em uma mobilização pacífica, a polícia recebeu ordens de atirar contra um grupo de manifestantes que oferecia o enorme perigo de estar cantando sentado no chão. Tudo parecia ficar ainda pior quando o frio passava e ficava apenas a amostra grátis do inferno: uma primavera com temperatura de 36ºC às nove da manhã.

Não tive palavras para expressar a liberdade que senti quando cheguei em Mariana. É verdade que a cidade poderia ser melhor, ter mais eventos para os moradores, mais atrações para os turistas, mais água nas casas no carnaval, mas o clima agradável, o ambiente histórico preservado, a gentileza da maioria das pessoas daqui fazem com que os lados negativos sejam abafados. Diferentemente do Rio, eu me sinto confortável aqui para ser quem sou e ir aonde quero sem me preocupar com toque de recolher. Há rumores de assaltos e alguma violência na cidade, mas, talvez por sorte, todas as vezes em que vi o sol nascendo na Praça Minas Gerais foram sempre muito calmas e pacíficas.

É importante que o clima de respeito ao outro permaneça em Mariana, afinal é um dos atrativos da região, e o trabalho da polícia militar tem sido exemplar nesse sentido. Por meio de denúncias dos moradores (não apenas nativos, mas estudantes também), alguns traficantes foram presos em flagrante. Outros, que já vinham sendo investigados, tiveram mandado de busca e apreensão expedidos e também pararam atrás das grades. É claro que ainda há muito a ser feito, vide a Operação Minerva, quem poderia vir para Mariana, e os constantes assaltos e ataques com bombinhas contra casas nos bairros São Gonçalo, Rosário e Santo Antônio, mas é necessário dar um passo de cada vez.

Já estive em muitas festas em residências de amigos meus, nativos desta cidade, em que viramos a noite bebendo, rindo e ouvindo música. Moro do lado de um clube onde festas acontecem normalmente e parece que estão dentro da minha casa. Comemorações são normais do ser humano e não há nada de ilegal nisso em um país democrático, como é o Brasil. Recentemente um estudante foi preso na Praça Minas Gerais durante um luau de confraternização entre universitários (muitos dos quais, marianeneses e ouropretanos). A situação: maiores de 18 anos cantando e consumindo bebidas alcoólicas. O flagrante: um violão.

Polícia militar, é verdade que a senhora só deve prender criminosos se tiver um mandado expedido por juiz? É verdade que o flagrante de um crime deve ser algo considerado ilegal? É verdade que a senhora só deve encaminhar um suspeito à delegacia em caso de flagrante ou se for procurado pela justiça?

Senhora? Senhora?

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